Já ouviu essa música do Cazuza? Que coisa clichê citar Cazuza, mas acho blasé essa gente que tem medo de citá-lo.
Nessa letra ele diz
Dizem que eu tô louco
Por te querer assim
Por pedir tão pouco
E me dar por feliz
Em perder noites de sono
Só pra te ver dormir
E me fingir de burro
Pra você sobressair
Dizem que eu tô louco
Que você manda em mim
Mas não me convencem, não
Que seja tão ruim
De uns tempos pra cá, me sinto meio Alice, abrindo uma porta atrás da outra, é tanta coisa que aprendo que às vezes me sinto grande demais, daqui a pouco vejo que tô miúda de novo.
Faz pouco tempo, fiz o curso da Maria Homem, O Feminino e o Trágico. Aprendi que o lugar da mulher, por muito tempo, foi o lugar de submissão, de silêncio. Ao logo da História, as mulheres foram conquistando espaços, mas essas conquistas sempre estavam ligadas ao trágico.
A mulher que abandonava o silêncio, que questionava, era chamada de bruxa, era rejeitada, queimada, morta.
Horrível, né? O fim era sempre a loucura ou a morte.
Pensando nessas opções, melhor ficar quietinha. Algumas não ficaram, talvez por isso eu esteja escrevendo livremente hoje.
Compartilhando um pouco do que aprendi, conheci a história da escultora Camille Claudel, que foi internada num hospício por 30 anos, onde morreu em 1943. O parceiro de trabalho e amante dela, você deve conhecer, o famoso Auguste Rodin.
Que fim triste o de Camille. Talentosa, sensível, criativa. Enclausurada, abandonada, sentenciada como louca. Camille terminou sua vida sozinha, sem reconhecimento algum. Todo o reconhecimento como artista veio muito anos depois de sua morte. Um filme lindo que conta a história dela, e que partiu meu coração, é Camille Claudel 1915.
Recentemente vi outro filme, inspirado na vida da juíza Ruth Bader Ginsburg.
Não conhecia a história dela.
Achei interessante, ela entrou em Harvard em 1956, a escola começou a aceitar mulheres apenas a partir de 1950.
Harvard foi fundada em 1636.
Na turma dela havia 500 homens para 9 mulheres.
Desde sua formação até o final da vida em 2020, ela lutou pelo direito das mulheres. E era o membro mais antigo da Suprema Corte americana.
O filme que vi se chama Suprema, é de 2018.
Desde sua formação até o final da vida em 2020, ela lutou pelo direito das mulheres. E era o membro mais antigo da Suprema Corte americana.
O filme que vi se chama Suprema, é de 2018.
Desde então, tenho lido muito sobre o universo feminino, faz parte do meu processo de autoconhecimento. Tenho percebido que muito do que vivi e vivo até hoje, é uma experiência parecida com a experiência de mulheres do mundo todo. Existem lugares culturalmente mais opressores, sem dúvida, mas de alguma forma todas nós temos um elo que nos une, todas nós precisamos nos reafirmar como seres humanos constantemente.
Não gosto do papel de vítima, mas é importante deixar claro que também não quero me tornar uma vítima. As mulheres vivem com esse medo constantemente, é um mecanismo de defesa que não garante nada, e é um estado de alerta que não evita nada. Me pergunto se os homens, os bons homens, estão conscientes dessa realidade.
Na escola ouvi muito a frase “Seu corpo é um templo”, como se fosse uma obrigação particular de cuidado, e é, concordo. Mas vivemos em sociedade, o mundo é coletivo. Pensando assim, também deveria ser ensinado aos homens que o corpo do outro, o corpo da mulher, também é um templo. Por ser um templo, respeite. Não agrida, não viole, nao subjugue. Escrevo isso sentindo um pouco de cansaço.
E não se trata apenas do corpo físico sendo violado e invalidado. Existe a mente, as ideias, os sonhos, os desejos de uma mulher que todos os dias são apagados, silenciados, subjugados. É também por isso que tenho lido tanto sobre o assunto. Me sinto menos sozinha, me sinto fortalecida.
Talvez eu tenha me perdido em ideias, e deixado pontas soltas, mas talvez alguém leia esse texto desabafo e se sinta menos sozinha.
Uma vez eu ouvi que deveria deixar pra trás tudo que eu já sofri. E pra deixar pra trás, é preciso mudar, não é? Tenho feito isso. E acho que pra mudar, é preciso abrir a mente. É necessário ouvir mais, e estar de coração aberto.
Por isso comecei com a música do Cazuza, Minha Flor, Meu Bebê. Eu gosto até do nome. Coisa carinhosa, sabe?
Pra mim, o amor é uma energia transformadora.
Os seres humanos são capazes de criar coisas maravilhosas, pense em Camille Claudel, Tarsila do Amaral, Jane Austen, Clarice Lispector, pra citar apenas algumas.
Seres humanos são capazes de mudar o mundo, como a juíza Ruth Bader Ginsburg, Maria da Penha, Angela Davis, Rosa Luxemburgo, entre tantas outras.
Mesmo assim, com tantas mulheres fazendo história, me pergunto o que faz com que alguns homens ainda se recusem a nos ouvir. E sempre que me deparo com um homem assim, visualizo um bebê, completamente indefeso, no colo de uma mulher que o amamenta.
Minha flor, meu bebê. Mas ele se esqueceu disso. Pobres dos homens que esquecem.